quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Assentar os pés na terra

(...) «Magníficat: a minha alma "engrandece" o Senhor, isto é, proclama que o Senhor é grande. Maria deseja que Deus seja grande no mundo, que seja grande na sua vida, que esteja presente em todos nós. 

Não tem medo que Deus seja um "concorrente" na nossa vida, de que com a sua grandeza possa tirar-nos alguma coisa da nossa  liberdade, do nosso espaço vital. Ela sabe que se Deus for grande, também nós seremos grandes.

Não oprime a nossa vida, mas eleva-a e torna-a grande: é precisamente então que se torna grande, com o esplendor de Deus.

O facto de que os nossos primeiros pais pensassem o contrário foi o núcleo do pecado original. Achavam que se Deus fosse demasiado grande, lhes poderia tirar espaço. Pensavam que deviam afastar-se de Deus a fim de terem espaço para si próprios.


Esta tem sido também a grande tentação moderna dos últimos três, ou quatro, séculos. Cada vez mais se pensou e disse: "Este Deus não nos dá liberdade, limita o espaço da nossa vida com os seus mandamentos. Portanto Deus deve desaparecer; queremos ser autónomos, independentes.


Sem este Deus seremos nós os deuses, e faremos o que nos agrada".


Assim pensou também o filho pródigo: também ele não entendeu que precisamente por estar na casa do pai era "livre". Afastou-se para um país longínquo onde desbaratou a sua vida. No fim entendeu que, em vez de ser livre, se tinha transformado num escravo, precisamente por causa do afastamento do pai; compreendeu que só regressando à casa do pai poderia ser verdadeiramente livre, com toda a beleza da vida.

O mesmo aconteceu na passada época moderna. Pensou-se e acreditou-se que afastando Deus, e tornando-nos nós autónomos, seguindo apenas as nossas próprias ideias e a nossa própria vontade, seríamos realmente livres; poderíamos fazer o que nos apetecesse, sem ter que obedecer a ninguém.

Mas quando Deus desaparece o homem não fica maior; pelo contrário, perde a dignidade divina, perde o esplendor de Deus no seu rosto.

No final converte-se só no produto de uma evolução cega, do qual se pode usar e abusar. Foi isto que confirmou a experiência da nossa época.

O homem é grande apenas se Deus for grande. Com Maria começamos a entender que isto é assim. Não adianta afastar-mo-nos de Deus, mas precisamente fazer com que Deus esteja presente, fazer que Deus seja grande na nossa vida. Assim também nós seremos divinos: teremos todo o esplendor da dignidade divina.



Apliquemos isto à nossa vida. É importante que Deus seja grande entre nós, na vida pública e na vida privada. Na vida pública é importante que Deus esteja presente, por exemplo, com a cruz nos edifícios públicos; que Deus esteja presente na nossa vida comum porque só então teremos uma orientação, um caminho comum; de contrário os contrastes tornam-se irreconciliáveis, pois já não se consegue reconhecer a dignidade comum.

Engrandeçamos Deus na vida pública e na vida privada. Isso significa dar espaço a Deus na nossa vida,m em cada dia, começando com a primeira oração da manhã, e depois dando tempo a Deus, dando o Domingo a Deus.

Não perdemos o nosso tempo livre quando o oferecemos a Deus. Se Deus entra no nosso tempo, todo o tempo se torna grande, mais amplo e mais rico.» (...)

(Bento XVI, em Castelgandolfo, 15 de Agosto de 2005)

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